Ex-subsecretário de Obras Paulo Sérgio seria um dos mentores do esquema
(Antonio Menezes)
Empresários
flagrados na operação Vorax expuseram à Justiça Federal, nesta
quinta-feira (21) a radiografia do esquema de fraudes em licitações e
falsificação de documentos na Prefeitura de Coari (370 quilômetros de
Manaus), no comando de Adail Pinheiro (PRP). O esquema, descoberto em
maio de 2008, teria desviado mais de R$ 25 milhões de obras bancadas com
verbas federais.
Nos interrogatórios
desta quinta (21), Carlos Eduardo Pinheiro, irmão de Adail Pinheiro, e o
ex-secretário municipal de Comunicação de Coari Haroldo Portela foram
apontados pelos empresários como os principais braços da organização
criminosa que, segundo a Polícia Federal (PF), era chefiada por Adail
Pinheiro.
De acordo com os
depoimentos, Carlos Eduardo agia constituindo empresas fantasmas em nome
de “laranjas”. Haroldo Portela era o contato dos empresários com
Adail Pinheiro,
e responsável por informar quando os recursos desviados eram
depositados nas contas das empresas envolvidas no esquema. Nove réus
foram ouvidos nesta quinta (21) na
Justiça Federal.
A
empresária Sônia da Silva Santos, proprietária da 3S Distribuidora
Comercial, declarou que foi cooptada por Carlos e Haroldo para
participar do esquema de desvio de recursos. A empresa fornecia
fardamento escolar à Prefeitura de Coari. E tinha sua documentação usada
em outros processos licitatórios.
Segundo
Sônia, a conta da empresa era utilizada pela organização para receber
recursos desviados. Em troca, Carlos e Haroldo prometiam comissões à
empresária. Promessa que ela alega nunca ter sido cumprido. “O prometido
seria que eu ficaria com alguma coisa, mas sempre inventavam alguma
coisa. Fui enganada”, declarou Sônia da Silva Santos.
Interrogada
pelo procurador federal, Sílvio Pettengill, a empresária se disse
arrependida, e alegou que, à época, não tinha consciência de que o que
fazia era crime. “Na época não tinha noção. Nunca imaginei chegar tão
baixo com a educação que recebi”, disse Sônia Santos.
Sônia
confirmou que a conta da 3S recebia depósitos de até R$ 600 mil, cada,
que em seguida eram devolvidos para a Prefeitura de Coari. A empresária
também admitiu que tinha conhecimento do resultado de licitações antes
mesmo de concluído o processo licitatório.
Farto material
Quando
a operação Vorax foi deflagrada, a Polícia Federal encontrou em uma
casa abandonada em Coari, documentos, carimbos e papel timbrados de
várias empresas, entre elas a 3S. Para o Ministério Público Federal
(MPF), o material era utilizado para compor documentação que era usada
em processos licitatórios fraudulentos.
Faturamento cresceu 600%
O
empresário Carlos William foi outro réu que admitiu participar da
organização criminosa. Segundo ele, eram depositados na conta da empresa
dele (a Carlos William ME), valores que variavam entre R$ 250 mil e R$
300 mil.
Carlos declarou que sacava o
dinheiro e repassava pessoalmente a Haroldo Portela ou a Carlos Eduardo
Pinheiro. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), por causa do
esquema, em 2006, o faturamento da empresa cresceu 600%, em relação ao
ano anterior.
A Carlos William ME
fornecia material de expediente à administração municipal de Coari.
Carlos disse que apesar de um acordo para receber 6% dos recursos que
fossem desviados por meio da empresa dele, não obteve vantagens.
“O
acordo nunca foi cumprido. O dinheiro caía na conta e eles (Carlos
Eduardo Pinheiro e Haroldo Portela) tiravam de imediato. Minha empresa
faliu por causa disso. Não obtive vantagens”, contou Carlos William.
Saques de R$ 1,5 milhão
O proprietário da “Na Elite”, Magno de Lima Raffa, também afirmou em
depoimento
que chegou a sacar R$ 1,5 milhão da conta da empresa e entregar a
Haroldo Portela. “Descontavam cheques em nome da empresa que eu nem
sabia”, disse Magno.
Magno era
responsável por contratar para Coari shows de bandas como RPM, Saia
Rodada e Calypso. “No começo, era tudo direito. Depois começou essa
trapalhada. O dinheiro que caía era passado para o Haroldo”, declarou o
empresário.
Após a descoberta da
organização criminosa, Magno disse que fechou a empresa, e hoje trabalha
fornecendo refeição para empresas do ramo da construção civil.
Segundo
o MPF, antes de “montar” os processos licitatórios, Haroldo
recebia o pagamento (feito pelo prefeito Adail Pinheiro) por meio de
cheque, e o depositava na conta das empresas.
Em seguida fazia com que os responsáveis das empresas sacassem o valor depositado e o entregasse em espécie.
Lideranças políticas prestigiam Adail
Adail
Pinheiro foi prefeito de Coari de 2001 a 2003, renunciando antes de
completar o mandato para não perder os direitos políticos. Em 2004, foi
eleito novamente, para um mandato de 2005 a 2008. O ex-prefeito também
denunciado na CPI da Pedofilia, é um dos políticos mais prestigiados por
lideranças políticas no Estado.
Comerciante atuou como ‘laranja’
O
comerciante Jacson Bezerra Lopes confessou que foi usado como “laranja”
de Carlos Eduardo Amaral Pinheiro, irmão do ex-prefeito Adail Pinheiro.
Segundo o MPF, o nome de Jacson fazia parte do quadro societário da
empresa Coman (Construtora Manauense), que depois teve a razão social
alterada para JBL Construções.
No
interrogatório, Jacson disse que, em 2001, Carlos Eduardo namorava a
irmã dele, com quem prometia casar. O irmão do prefeito teria procurado o
comerciante, à época lavador de carro em posto de gasolina, e pediu
ajuda para usar o nome dele em um negócio. “Ele disse que o nome dele
estava sujo. Ele namorava com a minha irmã, ia casar com ela, por isso
ajudei”, disse Jacson.
Segundo
Jacson, Carlos começou a levar documentos e por duas ou três vezes até
cheques para ele assinar. O comerciante alegou que não sabia que o nome
dele era usado pelo futuro cunhado por meio da empresa Coman.
De
acordo com a defesa de Jacson, a empresa em nome do comerciante teria
recebido<br/>R$ 16,8 milhões em contratos com a Prefeitura de
Coari. “Nunca nem fui a Coari. Moro em Manaus. Nunca recebi nem um
centavo. Descobri que era dono de empresa quando fui preso pela Polícia
Federal”, declarou Jacson durante o interrogatório.
Jacson
confessou que mentiu nos depoimentos que deu na sede da Polícia Federal
(PF) em Manaus. “Fui ameaçado (por pessoas ligadas a Carlos Eduardo)
todas as vezes que ia depor”, disse o comerciante, que também disse ter
sido “aconselhado” por um motoqueiro, no início do mês, a tomar cuidado
com o que iria falar no depoimento de ontem.
Compras feitas sem licitação
Segundo
investigações do Ministério Público Federal (MPF) Carlos Eduardo e
Haroldo Portela, de acordo com as “necessidades” das secretarias do
município, faziam as compras diretamente, sem processo licitatório.
As
compras eram faturadas em nomes das empresas participantes do esquema
fraudulento. Entre elas constam a 3S Distribuidora Comercial, Medicamed
Distribuidora e a Carlos William Pontes Bastos ME.
As
notas fiscais eram encaminhadas para a secretária de Finanças de
Coari, Rome Cineide, para que fosse agilizado o processo de
pagamento.
José Lobo
Acusado
como membro da organização criminosa, o deputado José Lobo (PCdoB), à
época secretário de Obras de Adail, foi citado nos depoimentos. Ele
teria pago R$ 10 mil para sócios da empresa Geometria transferirem a
mesma para pessoas ligadas à Prefeitura de Coari.